segunda-feira, 14 de abril de 2008

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CRISE AMBIENTAL: UMA RESPONSABILIDADE COLETIVA

Renata Venturim Bernardino*

A crise ambiental é um assunto que tem estado na mídia como resultado do progresso ou como pré-condição deste, reduzindo a questão à mudança do clima, ao desmatamento, à destruição da camada de ozônio ou a fenômenos da natureza que estão sendo acentuados. A problematização de suas causas e das possíveis “saídas” fica em suspenso, mas, por outro lado, a crise ambiental também abre um processo de ressignificação da produção, como expressão do limite da atual ordem.

Até os anos 60 e 70, havia o confronto entre três tendências: os conservacionistas, os “desenvolvimentistas” e os preservacionistas, predominando a defesa estética e a inviolabilidade dos parques e reservas ambientais. Sendo que, nesse contexto, se iniciava um “novo” ecologismo, um movimento que criticava a modernidade, os modelos de desenvolvimento capitalistas e socialistas, propondo a autogestão, o desarmamento e o pacifismo.

Foi a partir de dois grandes eventos: a reunião do Clube de Roma, realizado em 1968, e a Conferência de Estocolmo, em 1972, que a problemática ambiental passou a ser analisada como decorrência da política demográfica e do modelo de produção hegemônico. Desta forma, desenvolvimento pressupunha controle da natalidade.

Mesmo com as visíveis conseqüências negativas evidenciadas já na década de 60 e 70, ocorridas com a transformação da agricultura, somente na década de 80 que se começou a haver um crescimento do número de produtores rurais e de consumidores urbanos, com o apoio de Ongs e movimentos ambientalistas, que manifestavam a preferência pela agricultura ecológica ou alternativa.

É na década de 90, principalmente após a Eco-92, que se relaciona a crise ambiental à esfera do consumo e o consumidor passa a ser considerado o “novo” ator determinante nesse processo. Paralelamente à ampliação das mudanças de hábito de consumo, impostas por variáveis demográficas e socioculturais, também cresciam as práticas conservadoras e preservacionistas.

Com a prevalência do discurso neoliberal, ignoram-se as contradições entre ambiente e crescimento, pervertendo o pensamento ambiental e recodificando o ambiente como elemento do capital globalizado e da ecologia generalizada. Ignora-se que a crise ambiental seja fruto do modelo dominante de civilização, baseado na superprodução, no superconsumo e no subconsumo, desconsiderando a especificidade de cada região e as trocas desiguais entre paises, o que, por sua vez, tem causado degradações não só ambientais, mas também socioculturais.

É com o “poder” dado ao consumidor que se individualiza a problemática da crise ambiental. O consumidor cidadão seria aquele que pratica ações individuais e de racionalização da vida, realizando a economia do uso da água e da energia, a coleta seletiva do lixo, a reciclagem, a redução ou a reutilização de materiais, entre outras. Concomitantemente, ampliam-se os nichos de mercados e a venda de produtos com certificação, com rotulagens e selos verdes ou de “qualidade”, que não só agregam valor ao produto e que têm também a intenção de transmitir a idéia de um consumo sem culpa ou “consciente”. No entanto, pergunta-se: É desta forma que se constrói o “consumidor cidadão”? Ou seria mais uma expressão da “clientelização do cidadão”, como diria o filósofo Jürgen Habermas?

Esse “consumo consciente” tem sido significativo, mas tem se reduzido a ações paliativas que retroalimentam o próprio sistema capitalista, porque não rompem que a lógica do capital. Assim, é parte desse processo o controle ecológico, seja ele difuso ou institucionalizado por meio das obrigações jurídicas, como as que constam na legislação ambiental, norteadas pelos princípios da racionalidade, da precaução e da parcimônia, imperando a busca pelo “equilíbrio” entre as necessidades de ordem econômica, sanitária e “social” e do não esgotamento e deterioração dos recursos naturais.

É também por meio do controle do comportamento social não se soluciona a crise ambiental. Esta requer que se implante um outro modelo de desenvolvimento, com a internalização de princípios éticos e com o reconhecimento da complexidade dos processos naturais e das identidades culturais. Isso significa disseminar uma nova ética, uma outra política de vida, visando beneficiar o coletivo, no âmbito planetário. Mais do que acumulação de riquezas, do que crescer o Produto Interno Bruto – PIB e de outras variáveis econômicas relacionadas à renda, desenvolver é, sobretudo, ampliar a produção, a distribuição e o consumo mais eqüitativos e oferecer oportunidades reais para expandir as “capacidades”, de diferentes tipos, dos seres humanos. Ou seja, o desenvolvimento está imbricado com a percepção de que os problemas individuais devem ser vistos como problemas coletivos e públicos e resolvidos como tais – as redes de economia solidária, de comércio justo, cooperativas, entre outras “táticas” de grupos sociais podem ser experimentações nessa direção.

* Cientista Social, com especialização em Ciências Humanas em Desenvolvimento Regional, na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). E-mail: renatav.b@bol.com.br

Fonte: Pluridoc


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